O BRASILEIRO QUER SER EXTRAORDINÁRIO

“ Poha, e agora? Sou um branco de classe média e dentre os grandes problemas que tenho é a preocupação de passar no vestibular. Vou aprender a tocar violão... E nada de música POP; tenho que tocar Noel Rosa e Chico Buarque, os verdadeiros brasileiros. Eles sim são símbolos de nossa cultura. Estão pensando o quê? Não sou senso comum não, gosto da cultura brasileira e sou brasileiro! ”

É com esse discurso típico que eu começo meu texto, pois nessas palavras está o seguinte: o brasileiro tem aversão e medo de ser ordinário, comum. O jovem quando se veste radicalmente busca aquilo que lhe carece, identidade. Essa identidade não é RG. Metade dos problemas juvenis seriam resolvidos se fossem simplesmente isso, até porque nos bastaria ir ao Poupatempo. A identidade a qual me refiro é um pouco mais complicada. Ela implica a questão do ser humano, principalmente o jovem, pelo fato de ainda não possuir uma grande bagagem de experiências que o definam, querer formar uma imagem através da qual os outros possam identificá-lo e reconhecê-lo dos demais. O brasileiro deseja incansavelmente uma identidade e recorre, infelizmente e de maneira muito superficial, ao passado, muitas vezes tomando o aspecto da brasilidade como característica essencial e requintada. O fato é que não é necessário dançarmos samba e nos comportarmos de forma extremamente simpática e alegre para sermos reais brasileiros. O Brasil é o povo que nele vive enquanto os brasileiros são, entre suas diferentes e variadas particularidades, aqueles que vivem e fazem da sua casa o Brasil.

Meus amigos, o Brasil somos noses. Você pode gostar de Lady Gaga, não ter bunda grande e ser anti-social, não se preocupe, pois não é isso que define o quanto você é ou não brasileiro. Essa mania de retornar às origens nos faz inertes no tempo. Valorizar exacerbadamente a cultura das nossas raízes e fechar-se a coisas novas só nos tornará eternos masturbadores que não olham para novas possibilidades. Nosso passado cultural deve ser usado para a construção de novas vertentes artísticas e expressivas. É triste o hábito de ignorar e desdenhar a realidade crua brasileira para fantasiar um universo perfeito e tropical; de carnaval e povo festeiro. Antes criticar nossa realidade cheia de defeitos para a construção de algo melhor, do que fechar-se no quarto com livros e teorias belas, pensando que pensar é suficiente; de que idealizando uma outra realidade cheia de alegorias agradáveis e fantásticas. Assumamos nossa ordinariedade! O Brasil tropical já era. O Brasil é o que é hoje. O Brasil também é a São Paulo do trabalho e da correria, como qualquer outra metrópole de grande importância financeira, não precisamos plantar coqueiros na Avenida Paulista. Aceitemos nossos traços de hoje, que mesmo não sendo tão extraordinários e fabulosos, podem servir como brasilidade notável. Cultura não é o só o folclore dos livros, é, antes de tudo, a eterna reinvenção dos valores nacionais por meio da desconstrução e reconstrução.

Um povo notável não é necessariamente um povo de grandes e espetaculares feitos. Não necessitamos de um Lusíadas do século XXI, pois um povo notável é aquele que assume sua realidade como ela é. E essa atitude parte em primeiro lugar do indivíduo, que muitas vezes não cuida e valoriza da sua casa como deveria.

Não se busca a extraordinariedade, pois ela surge naturalmente, podendo muito bem implicar a simplicidade. Meus amigos, como diria Lobão: “Minha simplicidade é minha riqueza. Mas as pessoas querem ser ricas de uma maneira mesquinha.” Eu gosto de coisas comuns e daí? Quer dizer que para eu ser singular eu devo ser totalmente original? Pessoas que se dizem críticas e adoram censurar o senso comum, acham que sendo do contra passaram a ser notáveis, singulares e extraordinárias. Isso é babaquice. BABAQUICE! Ser do contra não é ser do senso crítico.

Gostem de vinhos feitos a partir de Cabernet Sauvignon por gostarem, e não por que é requintado. Gostem de Chico Buarque por gostarem, e não porque é cool. Leiam Dostoiévski pelo prazer de lê-lo, e não porque ler uma imensa quantidade de livros clássicos e eruditos te proporcionará um aspecto de intelectual.

Não estou dizendo que é justificável ser pacato, resignado, conformista e chucro. Há uma grande diferença entre simplório e simples. Um simplório aceita calado uma ditadura, por exemplo, enquanto o simples aceita humildemente seu dever cívico e individual em contrapartida daqueles que esperam a ascensão do povo a partir de belos e sedutores argumentos de homens “revolucionários” e vibrantes; o simplório não tem sede de cultura por acomodação e o simples assume sua ignorância querendo superá-la; o simplório acha que o conhecimento é inalcançável e um meio de ostentação para poucos, e o simples é aquele que pode não ser culto mas enxerga o conhecimento como força de ação acessível para todos; simplório diz que nada daqui presta e tudo da Europa é bom e top, ao passo que o simples encara os atrasos e problemas com criatividade.

Quem vos escreve é branco, da classe média, tem pais que trabalham em horário comercial e se apertam para pagar as contas no fim do mês, vai no shopping de vez em quando e assisti televisão. Mas que vê na sua simplicidade, sua riqueza.

Ser diferente é ser estranho? Ser comum é ser medíocre?

Texto: Felipe Novaes - Turma: 3º ano D, 2010